segunda-feira, janeiro 19

O Céu em Ascensão

Em todas as épocas remotas, o homem extrapolou a graça ou desgraça da sua Vida Futura, consoante o cumprimento ou não, dos deveres estabelecidos pela sua comunidade. Além disso, a ideia formada dessa vida estava na razão directa dos seus instintos e inclinações materias. Assim, para o guerreiro de sucesso, uma vida recheada de honras e fantasticos jogos de guerra lhe esperavam (relembro Valhalla); para o caçador, caça abundante e sem fim; para o homem sensual, os maiores prazeres da carne e da voluptuosidade, ou então, para o guloso, manjares faustosos e comida farta.

A Idade Média invade-nos com uma leitura intermédia (que ainda hoje perdura nalgumas mentalidades e círculos eclesiasticos): um domínio sublime e etéreo para além da comprensão humana mas - e note-se - frequentemente pintado com uma beatitude esterilmente contemplativa e, nas antípodas, um espaço aterrador onde as penas eternas não eram mais do que as torturas, suplícios e aflições que o homem encontrava na terra descritas em proporções desmedidas.

Por outro lado, ao alcance do homem contemporâneo, imagina-mos que as suas aspirações lhe remetem, sucessivamente, para um domínio mais “intelectualizado” e sensível: a possibilidade de continuação de seus trabalhos ou pesquisas culturais, agilidade cognitiva cada vez mais elevada e apurada, o reencontro com velhas amizades e entes queridos, um processo de reparação de faltas e males outrora praticados, sentimentos mais coerentes e intensos, serenidade e quietude e, para alguns, julgo que até a lucidez absoluta para todas as questões da física e da metafísica (o que não poderá ser - teremos sempre Mistério!).

Haverá então um “Céu” dinâmico e em progresso de acordo com a crescente complexidade da nossa consciência? Uma dimensão ulterior cada vez mais ajustada aos anseios e ao desenvolvimento da nossa razão e senso moral? E porquê? E haverá um dia uma concordância, onde a separação de mundos e espaços se diluirá cada vez mais, e torne-se, até, desnecessária?




António Canova, "Amor e Psique"

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